quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Sem título

Fazia tempo que eu não escrevia e hoje acordei com uma vontade louca de falar, gritar... uma cruel vontade de ser.
Entre sonhos e pesadelos, acordei com uma sensação de mundo diferente de todas as outras. Antigamente eu sabia falar de mundo, sabia falar de pessoas, de coisas, lugares, tempo, sentimento...
Hoje, ardentemente, percebi que ando desaprendendo de ser, desaprendendo de estar.
O mundo de significados que antes me sufocava e dava um nó na minha garganta, desapareceu. Ando ausente de mim, com falta da minha apaixonada mania de viver a vida.
Talvez pela correria do trabalho, pela correria de ganhar dinheiro (Sim! Hoje percebo o quanto isso move as pessoas e acho triste), talvez pela falta de amor... Não o amor sentimento, mas o amor realizado, concreto, gritado no mundo e inundado de “fetos”, “colos”, “naninhas”, “ceninhas” e outras coisas que só o amor realizado pode nos dar.
Sinto saudades do meu eu apaixonado-correspondido-acontecido... acontecendo... Saudades do cheiro de cebola fritando no azeite e de comer olhando nos olhos.
Por falar em saudade, tenho sentido-a ardentemente quando estou em meio à multidões. Tinha a sensação de que todas as pessoas do mundo estavam à procura de...
Triste... só tenho encontrado aquelas que fogem do encontro, que saem correndo...

Pequena interferência no fluxo do pensamento para uma cena:

Dois jovens sentados na sala de um apartamento. Estão ensaiando uma cena que será apresentada nos dias seguintes. Conforme ensaiam, é tamanha a empolgação de ambos que fogem do texto e começam a recitar poemas e textos que sabiam em mente.
O repertório de textos decorados se acaba e os dois partem para a estante de livros em busca de uma poesia “maior”. Acabam pescando Romeu e Julieta do amado Shakespeare, e começam a ler.

Romeu: Se a minha mão indigna profana este santo relicário, os meus lábios, rubros peregrinos, estão prontos a, como leve expiração, suavizar esse rude contato com um terno beijo.
Julieta: Sois muito injusto para com a vossa mão, bom peregrino, pois ela mostra nisto respeitosa devoção; as próprias santas têm mãos que são tocadas pelas dos peregrinos, e esse contato é como se fosse um beijo desses bons romeiros.
Romeu: As santas e esses bons peregrinos não têm lábios?
Julieta: Têm lábios, de que se podem servir só para rezar.
Romeu: Deixa então, minha santa querida, que os lábios façam o que fazem as mãos. Eles pedem, aceita a sua súplica, para que a minha fé não se mude em desespero.
Julieta: As santas não se movem, mesmo que atendam os rogos que lhes façam.
Romeu: Então não vos movais enquanto eu recolho o fruto da minha prece. Assim os teus lábios purificam o pecado dos meus.
(Beijam-se) Diz a rubrica de Shakespeare.

Os jovens olham-se fixamente nos olhos um do outro. (silêncio) Diz a minha rubrica.
Num sobressalto a jovem se levanta:
Jovem: Preciso ir... preciso ir... Estou me apaixonando por você nesse exato momento e não posso... Estou me apaixonando por você... preciso ir embora...

O jovem, boquiaberto, não tem tempo de impedi-la. Ela sai e não volta mais...

Pra mim, essa cena fala exatamente de como tenho me sentido: as pessoas “correndo” do mundo de possibilidades que um encontro pode oferecer (e um reencontro também).

Saudades de olhos nos olhos, saudades de construir com o tempo...

Quanto a mim, o amor ficou... estancado e eternizando-se aos poucos nesse peito limitado de ser humano frágil, delicado e pisciano. (com ascendente em peixes que é pra doer um pouco mais).

Amar, a partir de hoje, passa a ser uma escolha. E, acreditem, eu resolvi que...